20 de março de 2014

TRABALHAR PARA AQUECER?

 
Senti hoje uma urgência em falar-vos disto. Disto de perder a vida  a trabalhar, ganhando a vida, sem nada receber. Falo de reconhecimento e de mérito. É sobretudo disso que falo, mais do que remuneração pecuniária. Falo do desamor pelo produto do labor. 

Na sociedade como na vida, o objetivo de todos é satisfazer os seus interesses, desenvolvendo uma atividade profissional, que sendo bem sucedida, nos permitirá alcançar o prémio: ganhar dinheiro, alcançar reconhecimento social, ter poder. É com este desenvolvimento, ou se quiserem, com a finalidade deste propósito, que a vida gratifica os que nela intervêm trabalhando. Na procura da satisfação dos seus interesses, que incluem o reconhecimento doutrem, normalmente o agente soberano, mestre ou patrão,   as pessoas experimentam a expetativa, a esperança, o desejo e a vontade de se superarem e de serem, pelo seu trabalho, reconhecidos. É um esforço enorme, este que todos investem na sua vida profissional. E é por isso, por este trabalho que desenvolvemos tão afincadamente, como eu desenvolvo o meu, que a atribuição de prémios e reconhecimento de méritos se torna central, às vezes até esquizofrénico. Sem isto nada se concretiza na nossa cabeça. É como se andássemos infinitamente à roda de um poço, dando à nora, e de lá não saísse pinga de água. É como se o poço fosse somente um poço sem fundo, infinito de trabalho não reconhecido.
Hoje, ao acordar, a pregunta bailou-me na cabeça, tão logo, tão de repente, profunda e visceral.
Como se abrisse os olhos e de tudo, não conhecesse nada. Os cheiros, o quarto, a criança-homem que crio ao meu lado todas as noites, alimentando-lhe os sonhos, no sono.
São os ciclos, pensei. Chegaram. Na madrugada já se ouviam, e mesmo longe do mar, ouvi-os no marulhar das ondas, na praia ainda deserta.
É preciso ouvir os ciclos, é preciso escolher o caminho.
Já nada será como então, pelo menos na minha cabeça entendo assim, porque mérito e prémio, crime e castigo são a face e o verso de uma mesma medalha. Se eu não pequei, e se nada fiz para merecer este castigo, porque continuo ali com a cabeça enterrada na areia?
A pergunta que me surgiu de manhã,  foi uma pergunta de vício, de quem permanece muito tempo na mesma, sem mudar, mas que sente no peito algo diferente, já que os ciclos chegaram.
Então, em contraciclo com esta rotineira inércia intelectual, que me assola e que continuamente me faz questionar algo ridículo como:
- O que tenho de mudar para que tudo fique na mesma?
Eu respondo perguntando, hoje, na chegada dos ciclos e (finalmente) da primavera:
- O que tenho de fazer para que tudo mude?

Morrer de sede à volta de um poço, não é, nunca foi, e nunca há de ser, a minha praia. Assim continue ela deserta de inércia.
Mudemos então, de vida.
Ao trabalho!

(Há anos que sinto os ciclos, têm normalmente uma cadência de 3 anos, às vezes menos um pouco. São para mim avassaladores, e implicam sempre grandes mudanças na vida, sobretudo profissionais.)


 

2 comentários:

  1. o que tenho de fazer para que tudo mude, é a pergunta que se impõe quase diariamente. Por um vazio qualquer, a que prefiro não apelidar de nada, não encontrei ainda a resposta. Algo me há de surgir, no entretanto. Acredito nisso. Quero acreditar nisso. Um beijo, e olha, estamos equiparadas (nos 15!). E a ti, tem-te dado gozo esta aventura?

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  2. Cada dia mais. O que te posso dizer, ainda, sobre esta entrada, é que não te fies na esperança. A esperança dá cabo de nós... que estamos sempre à espera que algo aconteça e depois não acontece nada e é uma tristeza. A esperança, já o disse aqui e volto a dizer, é uma puta gorda.
    Beijos, vá e vê lá se animas a ervilha que hoje é o 1º dia, de muitos, de primavera e sol.

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