31 de outubro de 2014

Trogloditas: os novos pais


Eu não sei o que se passa com certas familias por estes dias, aliás, eu não sei o que se passa com as mulheres.
Esta semana já é a segunda vez que me deparo com textos esdrúxulos e duvidosos escritos por jornalistas do Público, que sou sincera, não sei se são verdadeiros, se são irónicos, se são escritos para agitar as águas, para revoltar os maridos, para vitimizar as raparigas, para enfurecer as mães dos rapazes, ou isto tudo junto, mas que me arrepiam dos pés à cabeça, lá isso, arrepiam.
É que vamos lá ver: a miséria familiar que é retratada neste texto pela Sofia Anjos, moça sempre muito aplaudia, muito partilhada, e a explodir likes por todo o lado, custa-me a engolir.
Ou a rapariga teve mesmo azar no homem que escolheu para casar e foi completamente enganada, ou então, se não foi, não percebo o que foi que lhe passou pela cabeça quando se decidiu por um troglodita deste calibre, sem sequer colocar a hipótese de que esse mesmo troglodita seria o responsável pela reprodução genética da sua família, através dos filhos que viessem a nascer, depois de tudo o que sabe sobre as dificuldade de criar um filho na nossa vil sociedade, mesmo com a ajuda de um super-pai e de uma super-mãe.
Não sei se fui só eu que tive uma sorte danada, é que se fui estou muito grata, por ter um marido-pai ao invés de um marido-progenitor, porque no fundo o que vejo neste artigo de opinião, muito mal escrito por sinal,  é que os novos pais não são pais, são apenas trogloditas reprodutores, que em nada contribuem para o crescimento e para a alegria dos seus filhos, isto enquanto transformam as suas mulheres em escravas da maternidade e únicas responsáveis pela formação dos seus rebentos.
Eu não me revejo numa única linha deste texto, minto, o meu marido é do Benfica, e ainda assim, depois de ter uma filha ao colo com trinta e tal quilos, a fazer-lhe perguntas, a dançar frenética, ou a fazer trezentas macacadas em frente à televisão durante os noventa minutos do jogo, ainda lhe tira a cera dos ouvidos, cuidadosamente, para ela ouvir melhor as músicas da Violleta.
Aliás, se eu comparar a geração do meu pai, dos meus tios e avós com a geração do meu marido, consigo encontrar uma mar de diferenças. 
E estou mesmo em crer que muitos dos rapazes da minha idade encontram na paternidade a grande felicidade da sua vida, dedicando aos filhos todo o tempo que podem, participando e descobrindo a cada dia aquilo que no passado era terreno feminino, muitas vezes sem que essa divisão fosse necessariamente culpa sua, mas antes de 'tradições' e do 'era assim' do tempo do feminino-submisso.
Não posso, nem quero acreditar, que este texto, mesmo que irónico, tenha como finalidade a generalização do que são os pais de hoje, ou que queira passar uma imagem de 'coitadinhas das mulheres-as-sempre-sacrificadas'.
Há casos destes, infelizmente há, mas nem de perto e nem de longe, são a maioria.
Os novos pais não são trogloditas. Os novos pais evoluiram e estão cada vez melhor. Os novos pais são muitas vezes aqueles, que além de cuidarem dos seus filhos biológicos, ainda educam e amam os filhos de outros casamentos, com tanto empenho como se fossem seus.

Sofia Anjos, miúda, se a descrição que fazes é baseada em factos reais da tua vida, tu não percas mais tempo com um marido desse calibre.
Manda-o ir matar melgas ou isso. 

Halloween: trick or tretas?

Muito bom dia a todos, caros leitores, caros amigos e simpatizantes da Uva Passa.
Hoje trago-vos a interessante história de Halloween, de uma pequena mas tesa família do subúrbio, que também poderia ser a vossa, se os vossos pequenos dráculas, bruxas ou aboborinhas fossem colegas de turma da minha pequena fada dos dentes de vampiro.
Desde há uma semana a esta parte, que andamos de volta de capas de vampiro, de dentes de drácula, de cartolinas roxas para fazer chapéus de bruxa, de corninhos de diabo, de batons vermelhos como a Marilyn Monroe, de calças pretas, de ténis vermelhos e de tudo o que podem imaginar para o grande dia de Halloween, que é hoje.
Como podem imaginar, toda esta preparação anual, nos rouba parcos e preciosos minutos que temos ao final do dia para fazermos  as quinze toneladas de TPC diário (eu faço os de português, o pai os de matemática, enquanto a miúda dorme o sono dos justos) e por isso, esta tesa família do subúrbio, que aguenta com o mundo todo às costas e ainda alguns planetas, anda por estes dias pior que os zombies da nonagésima oitava temporada dos Walking Deads, quando só lhes resta  um pequeno cerebrozinho com perninhas e uma boca.
A professora pregou-nos uma trick e faltou (mais uma vez).
Quer isto dizer que todos os trinta e dois meninos, bruxinhas, vampiros e aboborinhas que pululavam a caminho da escola, com os seu fatinhos, com a sua alegria, um entusiasmo radioso, mostrando efusivos os fatinhos uns dos outros, e as mães, cansadíssimas mas igualmente contentes pelo resultado de tantos dias de trabalho, chegaram ao portão da escola e foram todos recambiados.

Se por acaso se encontrarem com três cerebrozinhos na rua, um deles com uma capa de vampiro, e lábios de diva, somos nós.
A voltar para casa.
É triste.

30 de outubro de 2014

O que era preciso, era inventar o ganzómetro!

Sim.
Para podermos atestar, sem sombra de dúvidas, quem na blogosfera tem a moca maior.
É que de vez em quando, e de acordo com certos posts, o que me apraz dizer é:
Mete mais tabaco!


E fora de nós, nada.

Um dia, há muito tempo atrás, quando perdi uma pessoa muito muito querida, senti uma forte pulsão, quase incontrolável, dolorosa mesmo, que me impelia brutalmente para longe de mim.
Queria estar em todo o lado menos aqui, comigo. Queria cantar alto, queria dançar até de manhã, queria rir à gargalhada, conversar com os amigos até de madrugada, queria enliar-me em tudo, menos estar dentro de mim. No meio do nada. 
Aquilo que eu tinha - além de uma tristeza imensa, uma ausência, e um luto infame e doentio, que lutava contra mim, devorando a cada dia a luz dos meus olhos - era um pensamento intruso. 
Eu não o chamava, não puxava por ele, mas ele vinha, e ia, a seu bel-prazer, a qualquer hora do dia ou da noite, e ali se instalava durante muito tempo martelando-me a cabeça. 
Depois, o intruso, como se não obtivesse qualquer resultado, além de uma lágrima perdida numa vagal expressão de pena, ia-se, deixando-me cheia de dúvidas e de culpa.
Para explicar isto melhor, para que possam também vocês perceber o que se passava comigo naquele tempo, imaginem-se debaixo de uma fonte, em silêncio, sofrendo uma dor pungente, e uma gota caindo, intermitente, no alto da vossa cabeça. 
A gota, ou o intruso, fazia-me uma pergunta, sempre a mesma, pim, pim, pim.
Porquê? Porquê? Porquê?
Nessa altura, louca, porque aquele intruso me transformara numa marioneta, manietando-me habilmente, subjugando-me como a abstinência subjuga o heroínómano, fez-me caminhar imenso, levou-me a muitos sítios, a muitos credos e muitas teorias, na tentativa de acabar com aquilo.
Precisava saciar o intruso. Dar-lhe uma resposta e calá-lo.
Mas tal como é imensa a morte, também os intrusos de agigantam, e se não os detivermos, matamos a alegria. A depressão impõe-se a tudo, e depois dela, a alegria nunca mais será mesma.
Foi Deus. Foi o destino. Foi karma. Porquê? Porquê? Porquê? Porquê?
Um dia, numa cidade muito bonita chamada Setúbal, onde eu estava de visita, um rapaz, creio que na altura meu colega de trabalho, disse-me a seguinte frase:
Tu estás a fazer tudo mal. Tu não podes procurar fora de ti a resposta. Eu não tenho a resposta. Ninguém tem. Tu não podes deitar as mãos ao ar e fazer perguntas ao céu. Julgo que saberás que o céu não fala. 

Ele tinha toda a razão. 
Nunca saberei porquê. 
Estava a fazer a pergunta errada no sítio errado. Estava a fugir de mim em vez de me encontrar.
Deveria antes perguntar: como? 
Como seguir em frente.
  
Creio que as imagens que vos deixo aqui hoje, e que me levaram a escrver este texto, são de mulheres que como eu não deixaram que a morte da alegria de sobrepusesse ao caminho que tinham ainda para percorrer. 
A resposta não está fora de nós, na aparência física, em deuses, na opinião dos outros.
A resposta está dentro de nós, e é aí que deve ser procurada.
Isso, ou ficarmos perdidas para sempre no nada de coisa nenhuma.
O céu não fala, mas alegria grita muito cá dentro.
É preciso encontrá-la.
Além de tudo.












29 de outubro de 2014

Se me pedem para tirar mais fotocópias hoje, eu juro! Vai tudo corrido a pontapé!



Quando os sonhos acordam

O seu sonho sempre foram os livros.
Ainda pequenina, quando todas as meninas da sua idade se apaixonavam pela carinha e pelos caracóis das suas bonecas, e ficavam tardes perdidas falando sozinhas, calçando sapatinhos, vestindo saínhas, exercitando e transferindo para as suas bonequinhas uma vida de faz de conta, igual à vida de todos os dias, a Madalena abria livros.
Às vezes, perdida na sua imaginação de criança, fazia tendas da Grande Enciclopédia dos Animais que o pai lhe comprara numa viagem ao Brasil, e encolhendo muito os ombros, para não estragar a casinha, enfiava lá a cabeça, fincava os cotovelos na alcatifa, e olhava perdida para a forma estranha de um peixe-palhaço.
- Madalena! O que fazes aí debaixo?
- Estou na selva mãe, hoje abri na parte dos macacos. Sabias que os macacos comem os piolhos uns dos outros?
- Mas Madalena, assim dás cabo dos livros do teu pai, olha as folhas, todas enroladas na alcatifa.
Mas Madalena não queria saber das folhas e nem da alcatifa, queria antes saber das letras, porque eram as letras que lhe ensinavam que no mundo, havia vários tipos de folhas, e não só as que tinham as letras.

O meu sonho sempre foram os livros.
O meu sonho era poder sentar-me todos os dias, muito cedo, e escrever uma história.
Ficaria muito feliz se a escrevesse numa sala cheia de luz, onde eu pudesse pendurar, numa grande janela virada a sul, um fino pano de linho, muito branco e que, de tempos a tempos, um gatinho muito pequenino viesse visitar-me as letras, e dar-me um carinho.
Levantar-me-ia muito cedo, para ter o sol só para mim e iria em bicos de pés inspirar o cheiro quente e doce que só as crianças podem ter.
Gostava de acordar no meio dos livros, rodeada de muita gente, que embora ausente ou imaginada, me trouxesse a calma à manhã, que eu procuro e não encontro, de madrugada.
Gostava de ler muitos livros, e viver uma vida mais calma.

Mas quando os sonhos acordam estou parada, trancada, amordaçada em pensamentos maus.
Tudo me aborrece, não quero chegar, não quero estar, tudo se repete.
Mas que faço, se este sol não me aquece?
Os meus pesadelos, outrora cativos do sono, permanecem acordados no despertar, e ando com eles todos os dias em mim, pesados.
Ando estafada.
Desculpem usar um pensamento antigo, mas esta vida corrida não leva a nada.
Esta vidinha amorfa que levo, não me ensina nada.
É mais dificil fingir a felicidade do que ser verdadeiramente infeliz.
Preciso de mais tempo para mim.
Quero antes carregar os sonhos.

28 de outubro de 2014

Blackout !!


Grande notíca!
Seis dias de escuridão total, devido a uma tempestade no Sol, que deixará o planeta totalmente às escuras, nas vésperas do Natal.
Umas pedras manhosas e muita poeira, vão tirar-nos 90% da luz.
Os teenagers já estão em grande alarido, vai ser sempre a desbundar na night, seis dias de seguida, e os restantes humanos, já se sabe, fica tudo na caminha a dormi-la, porque ninguém trabalha de madrugada.

A notícia é falsa, obviamente, mas atentem-se nos comentários on-line, que fiz questão de responder.
É de ir às lágrimas.

Jéssica Boneco
Mas podemos sair à rua? 
- Não. As pedras podem acertar-te na cabeça, e aí é que podes ficar a ver tudo escuro, à séria
Simão Entruco
Mais aqui no brasil tambem vai ficar escuro? 
- Não. O Brasil goza de forte reputação junto do Deus Sol. É o único país que não terá escuridão, aliás, as pedras e as poeiras já se reuniram em plenário para se afastarem dessa zona protegida.
Daniel Chusyd
Messias está chegando.
Não sei. Mas o Messi já cá está.
Daniela Gaspar
Será que é verdade????
Só sei dizer que Jesus está voltando e vai acontecer muitos sinais quem não acreditam ou não, é o Apocalipse.. muitos sinais estão acontecendo. 
- O Apocalipse é no exato momento em que Portugal souber o verdadeiro défice. Mas nós aqui já estamos às escuras desde 1500.
Elaine Cristina
A minha filha está prevista nascer precisamente nesse intervalo de dias, não ver a luz do sol era tristonho.
- Não faz mal. As crianças não podem apanhar sol na moleirinha. Vê-se por exemplo que foi o seu caso.
Filipe Roberto
E logo a seguir, de 24 para 25, vem o Pai Natal.... acreditem....
- O Pai Natal está super contente. Vais ter seis noites para ditribuir prendas. Deram-lhe um bónus de 5 noites.
Wendel Araújo
Vou fumar todas essas pedras e nos salvar.
- Não fumes tudo...
Roberta Borges
E minhas plantinhas como vão ficar assim na escuridão? Sirá que dá com vela? 
- Dá com velas sim senhor. Algumas plantas vão muito bem queimadas. No cachimbo. Dá-lhe gás!  

Pessoas com cães Vs. Pessoas sem cães

É verdade.
Andei aqui três dias a ver se me continha, mas não fui capaz.
Ainda estive tentada a falar sobre a reforma do Cherne, mas depois lembrei-me que havendo pessoas que ganham essa miséria de reforma por dia, era bem capaz de não fazer sentido, e além de correr o risco de deixar o homem ofendido, a verdade é que certas reformas pornográficas portuguesas, acabam por ser um tema banal.
E aqui a Uva não gosta de temas banais.
Caso gostasse, assistiria semanalmente à Circunferência do Quadrado, que para quem não sabe é o programa do Medina Carreira, quando ele se põe às voltas com o seu pensamento de quatro lados, todos iguais.
E a Uva, depois desta inaceitável ausência de três dias, gostava de abordar um tema útil, uma coisa que toda a gente pudesse comentar, intervir, opinar, só para não parecer que está para aqui a falar sozinha, e que este blog é afinal muito mais do que um eco xoxo e solitário, igual a uma uva-passa no fim do Reveillon.
Foi então que teve uma epifania. 
Depois de ler uma crónica deliciosa do Público, a Uva Passa, este blog onde há três dias nada se passa, resolveu elencar três ou quatro situações da vida quotidiana que diferenciam o casal moderno, não nesse tema maçudo e desgastante do ter ou não ter filhos, mas numa esfera mais virada ao prazer. Cães.
Surpreendidos? Bem me pareceu.
Vamos então a isto.

As pessoas sem cães cheiram ao novo perfume da Cristina Ferreira.
As pessoas com cães cheiram a cão, e ás vezes cheiram a merda de cão.

As pessoas sem cães, comem pela manhã uma taça de açaí do Amazonas, com granola e leite de cabra dos Alpes Suíços e tiram selfies vestidas com as suas túnicas de linho branco, debruadas de prata e cristais Swarovski.
As pessoas com cães, de manhã não comem nada, vestem um robe ou outra porcaria qualquer e saem disparadas de casa, ramelosas, antes que o bichinho mije a cozinha toda ou deixe um rasto de merda até à porta da rua.

As pessoas sem cães, no final do dia vão ao ginásio ou fazem caminhadas a ouvir musica no seu Ipod.
As pessoas com cães, no final do dia, vão buscar a trela, agarraram num saco de plástico do Continente, vestem um robe ou uma porcaria qualquer, e vão fazer um desporto muito em voga nas cidades que se chama 'apanha-cocós-ainda-quentes-e-às-vezes-moles'.

As pessoas sem cães, no final do dia vão ao cinema, jantar fora ou assistir a uma peça de teatro.
As pessoas com cães, no final do dia, correm para casa, esbaforidas, para ver se os cães ainda não lhes roeram os filmes, os pratos, os sapatos e as pernas das mesa da sala de jantar, tentando evitar que o bichinho mije a cozinha toda ou deixe um rasto de merda até à porta da rua.

As pessoas sem cães vêem thrillers, dramas, romances, sitcoms.
As pessoas com cães vêem essa merda toda, mas em formato 3D, na sua própria casa, especialmente dos 0 aos 6 meses de idade dos seus animais, num filme chamado 'A raivinha-dos-dentes' (em repeat).

As pessoas sem cães ficam febris por beber duas taças de vinho reserva em frente à lareira.
As pessoas com cães ficam febris devido à febre da carraça.

O homem sem cão, fuma à janela o seu charuto de Havanna.
A homem com cão, atira-se da janela e estela-se no chão.
Vinte minutos depois cai o seu couro cabeludo.
O homem sem cão é careca.
O homem  com cão usa um shampoo que lhe atrasa a queda do cabelo.


PS: As pessoas com filhos e com cães, coitadinhas, umas mátires, já não existem.
Suicidaram-se.

Esta rapariga é estúpida ou faz-se?

Luana Piovani insulta Portugal


“O Brasil foi explorado tantos anos por Portugal e agora continuará sendo pelo PT! Não é à toa que a sigla de Portugal é PT! Eu votei Aécio (Neves)”, escreveu a atriz brasileira Luana Piovani no seu Twitter, minutos depois de confirmada a reeleição da presidente Dilma Rousseff, ontem à noite."

E eu, que na minha imensa ignorância pensava que o Brasil, desde que alcançou a sua independência a 7 de Setembro de 1822, sempre foi governado por elites brasileiras: politicas, industriais, económicas, financeiras, culturais e militares, estou redondamente enganada, e agora, passados 192 anos, 1 mês, e 21 dias sobre a data dessa Independência, aparece-me esta ressabiada, para me provar com a sua mente iluminada que o partido PT é afinal o nosso Portugal travestido de Dilma Rousseff, numa farta cabeleira.


"Falo o que penso, não o que vocês querem ouvir”, sublinhou a atriz.
E quem é que te disse que queremos saber o que pensas?
Vê lá isso, e já agora: põe-te a milhas.

24 de outubro de 2014

E esta hein?

http://bigappetites.net/

Mas por outro lado

Este é o segundo ano em que a minha filha tem meninos de outros anos na salinha dela, porque as outras professoras não aceitam mais de quarenta e sete alunos nas suas salas. Foi também este ano que resolveram substituir o telhado de amianto da escola e colocar sanitas que funcionem na casa de banho das meninas.
Isto na escolinha dos pequenos, porque nas escolinha dos grandes, ainda no outro dia a minha colega recebeu um telefonema do filho, muito aflito, porque estava na casa de banho com um desarranjo intestinal e não tinha papel higiénico.
Vai daí que a minha colega se levantou da secretária, agarrou na mala, apanhou o barco e foi até à escolinha dos crescidos, para ajudar o filho a limpar o rabo, com o papel higiénico fornecido pela sua entidade patronal.

Por outro lado as crianças mais crescidas, tiveram uma agradável surpresa porque na primeira aulinha de português do ano, já perto do Natal, apareceram vinte e três professores, todos colocados naquela escola e na mesma disciplina, para ensinar a várias vozes o novo e interessante acordo ortográfico.
Vai daí, que alguns alunos tiveram de se retirar da sala de aula para sentar os vinte e três adultos, que ficaram muito entretidos, a discutir as maroscas do Nuno Crato e a preencher o formulário de pedido de mais mobiliário escolar.

E eu fico a pensar, ainda relativamente ao mundo surreal em que me encontro, que o meu problema é muito normal e que eu sou uma egoísta que só penso nos meus problemas.
Vai daí que o melhor é ir trabalhar, em vez de me levarem para o hospital, porque hoje, dizem, está uma greve tão feroz, que era preciso eu ter um gigante dessarranjo intestinal, e dizer que tinha acabado de chegar da Libéria, para me darem, vá, um comprimido Ben-U-ron 500mg. 

Já sabemos quem ganhou o eurogasosas?
Marido, fomos nós?
(silêncio gutural)
Pois...

23 de outubro de 2014

Surreal. Levem-me para o hospital.


O surreal desconserta-me, deixa-me os pensamentos à tona, turvos, como um mosquito em apuros, que esperneia no grande espelho d' água.
Como eu.
O que estará um pé a fazer na boca de uma cigarra?
O que faz um dedo vestido de fraque?
É tudo tão estranho e tão estúpido que por vezes achamos que é belo.
Mas não é.  

Pelo menos para mim.


Há na minha vida muita gente surreal, grandes artistas que sem saber, ou inocentemente, pois que outra razão poderiam ter para me desconsertar assim a vida, fazem coisas que me impedem de seguir em frente.
O surreal tomou conta da minha esfera doméstica, que já não consigo controlar. Por um lado há factores externos que a conspurcam, que a transtornam, e por outro (o que chega a ser ainda mais surreal), é que os cenários que certos artistas pintam no meu quotidiano, me fazem sentir mesquinha e embrutecida.

Chovem na minha cabeça emoções frugais. 
Vagais sentimentos de culpa.



Deixando agora o etéreo, antes que vocês me adormeçam, vou tentar explicar em poucas palavras o que vocês todos querem saber.
Que mosquito me mordeu?

Há problemas lá em casa, derivados de um certo surrealismo escolar.
 Fazem-me a cabeça em água.


Tudo é surreal.
Depois de onze horas de trabalho, duas horas de tormento. E eu bem tento, mantê-la acordada.
Depois de oito horas de aulas, doze fichas de matemática e uma composição.
Depois de uma semana de trabalho e muitas horas de escola, pintam-se três cartolinas roxas, recortam-se frutas e trouxas, num fim de semana de calor.
E o amor?
Depois do jantar, três marmitas para preparar,  um banho para tomar. E um poema para a mãe.
Ditongos, cantigas. Divide as seguintes silabas, circunda o resultado.
Todos os dias tabuadas, todos os dias composições, todos os dias sermões.
E as emoções? Não valem nada?
Não entendo como é que uma miúda de sete anos, que passa um dia inteirinho na escola, ainda traz uma mala cheia de fichas para fazer diariamente.
O que têm em mente?
Deixar-me maluca?
Já não sei onde me meta. 
Sinto-me mal. 
Perco a tineta.

Saio disparada com uma marreta em riste, ou chego-lhes a roupa ao pêlo com o meu velhinho martelo?
Era um belo quadro. Uma linda tela.
Pedacinhos de massa cinzenta voando por todo o lado.
E colibris de todas as cores debicando a mistela.
Surreal. 

Levem-me para o hospital...


Olha um comentador zangado a saiiiiiir!!!

Isto uma pessoa tem de pensar muito bem antes de publicar um post.
Não basta a pessoa ser criativa, ter aqui os dedos a teclar meia hora de enfiada, tudo muito bem escrito, sem erros ortográficos, lutando para não trocar o tras pelo traz, o quaisquer pelo quaisqueres, o à pelo há. Pois não meus amigos, isto tem de ser tudo pensado e repensado, e uma pessoa tem de estar SEMPRE à altura de todos, a condizer com todas as opiniões, e a manter uma atitude inócua perante as merdas que se passam nesta cesta que é a vida, não venha de lá algum leitor mais sensível empurrar-nos com toda a força contra a parede e dar-nos um cuspo!
Foi o que me aconteceu por estes dias, e eu, esta moira de trabalho, que andava aqui tão sossegada, tão na minha, a ver se me saía algum post mesmo em bom, uma obra prima da literatura, um prazer das palavras, sem roubar um minuto ao meu patrão, quando um amigo careca resolve lançar-me uma praga cabeluda e interromper-me o processo criativo matinal.
Não acreditam? Pois conto-vos eu.
O homem zangou-se com o post sobre os carecas, e eu não percebo porquê. 
Pois então não foi uma coisa assim pessoal, uma coisa de gostos-que-não-se-discutem, um postezinho tão sem ponta?
Pois não foi, não foi.
Vejam bem a posta que este amigo me deixou:

' Uva, ou deverei dizer loira careca? ando há dias a remoer o teu post sobre os carecas que acho que foi de total mau gosto. Muito estúpido. O que é que tens contra as pessoas que usam barbas grandes e que tiveram a infelicidade de lhes cair o cabelo? Eu até gostava do teu blog mas agora xauzinho.'
 
Caro anónimo, suponho que por esta altura já deva estar bem longe, mas perante factos não há argumentos, e eu sou uma Uva sensível.
Retiro tudo o que disse sobre os barbudos.
Juro!


21 de outubro de 2014

Já que ninguém diz nada...

... digo eu!

Sim. Aconteceu novamente.
Sim. Cheguei mais um dia atrasada ao escritório pelo mesmo motivo das últimas vinte e quatro vezes.
Sim. Vim totalmente entalada, que é como quem diz enchoiriçada, no caminho entre a Calçada da Carriche e o Marquês de Pombal, apanhada que fui uma vez mais, num transito infernal igual aos que se fazem sentir todos os dias, mas com maior dureza nos dias de greve dos trabalhadores do Metro, ou quando é fim do mês, ou quando chove, ou quando joga o Benfica, ou quando chega a data de meio Portugal renovar o cartão de cidadão, ou quando faz sol, ou quando está frio, ou se faz vento, ou se surgiu algum contratempo e foi precisa a viatura, que ir de autocarro para Lisboa além de ser uma penúria, dá ares de classe baixa.
Sim. Saí de casa meia hora antes.
Sim. Foi um dia bastante concorrido para os transportes alternativos, que se excederam em números inimagináveis, vá, de mais três ou quatro carreiras em cada percurso.
Sim. Os autocarros encheram-se de tanta gente que a maioria nem viajou sentada, muitos foram de pé, alguns a levitar, e quase todos sem pagar o bilhete, que isso de andarem trezentas pessoas dentro de uma salsicha onde só cabem quarenta, tem vantagens, principalmente quando se entra pela porta de trás, atalhando o caminho impossível de percorrer até ao motorista.
Foi um transtorno muito grande para os pobres Lisboetas, que na sua grande maioria nem usa os transportes públicos, mas então, o bota-abaixo é uma praga, uma moda, e ademais está aí para toda a gente o utilizar, e  digo mais, caso os trabalhadores do Metro não se ponham a pau, a revolução social que se adivinha desde a 'grande-manifestação-dos-não-sei-quantos-de-setembro-de-dois-mil-e-carqueja' será toda contra eles, os grandes lambões de salários pornográficos e regalias intergaláticas.
Os grevistas são uns egoístas da treta, pois que são, uns miseráveis que lutam pelos seus direitos usando como espada todo um povo dependente de transportes públicos, um povo sofredor, usurpado indecentemente pelo indigno direito à greve, por aqueles que esgrimem contra tudo e contra todos a sua raiva patronal.
É ultrajante! Uma filha da putice!
Eu trabalho no privado e não posso fazer greve, mas eles, os que vivem no bem bom, fazem grave trinta e seis vezes por ano. Uma grande ronha é o que eles tem no cu, haviam de trabalhar como eu trabalho, e sentir a fome que eu tenho de acabar com a pouca-vergonha.
Que se privatize o Metro e se derrube de uma vez por todas o braço armado do PC que é a CGTP.
Que se privatize essa gente toda, as águas, a EDP, a PT, os CTT, a TAP e todos os serviços públicos que fazem parte da cultura do Estado Social. Que se amarre às cadeiras o trabalhador, que prevaleça uma democracia onde quem manda é o demo. 

Já que ninguém diz nada, digo eu!

Sabeis o que faria um povo evoluído? Apoiaria todos os trabalhadores que se manifestam com a única arma que ainda lhe resta, a GREVE (já que o voto é por estes dias um bocado de papel higiénico que nos serve apenas para isso mesmo) ao invés de desdenhar e invejar as condições salariais dos outros.
O que nos transtorna, não é o facto dos outros fazerem greve, é o incómodo de nós não podermos fazer também.
O que nos perturba, não são os salários pornográficos que o CM desnuda nas parangonas incompetentes da primeira página, o problema é que na nossa cabeça eles não podem almejar essas condições, porque nós também não podemos.
Eu quero lá saber da greve dos médicos se nunca estou doente.
Eu quero lá saber da greve dos estivadores se não faço exportações.
Na nossa cabeça domesticada, ninguém que ganhe mais de quinhentos euros se devia manifestar.

Já que ninguém diz nada, digo eu!

E digo vinte e quatro vezes, e digo oitenta vezes, e todas as vezes que uma classe social exprime o seu descontentamento, a sua aversão e a sua incompreensão perante as condições de trabalho.
E digo outras tantas, porque se eu não posso ter voz, que tenham os que (ainda) podem falar.

Porque nós não somos só nós, nós, os que não podem fazer greve, que permanecemos mal tratados, mal remunerados, trabalhando que nem cães em sítios obscuros e bafientos, queremos é que todos sejam como nós, porque assim é que é bonito e assim é que se faz.
É que ninguém diz nada mas eu digo, que aqueles que ainda podem fazer greve, um dia deixarão de fazer, um dia deixarão de se ouvir, e todos faremos parte de um mesmo grupo todo igual.
Ahh, se os visses agora calados e submissos, cortejando as hierarquias, tratando por doutores e senhores aqueles que um dia pensaram que Portugal era só deles, havias de dizer que Portugal são só capachos. Uns dos outros.

Porque os que são contra a greve do Metro porque  não podem faltar ou chegar atrasados por medo de serem despedidos, os que não podem falhar um dia ao trabalho porque o dinheiro não lhe chega ao final do mês, vivem condições de trabalho maravilhosas, e assim querem continuar.

É que não há almoços grátis, mas parece que queremos todos entrar no regime imposto pelas privatizações: o come-e-cala.
Talvez entregar o Metro ao Zeinal Bava, ou ao inenarrável Salgado, esse guru da gestão privada.
Assim como assim parece que o homem está sem emprego.
E é preciso ajudar esta gente.

Uma Uva a tentar passar despercebida numa terça feira de manhã.


 Debaixo da secretária, escondida da colega das fotocópias dos processos-crime do BES.
O cabelo é novo. Comprei-o ontem na tentativa de os enganar. 
Toda a gente pensa que ainda sou uma loira careca.

A tentar fazer sinais à minha colega dos cafés, a única que me compreende, pelos buraquinhos da minha secretária, na tentativa que, sem que ninguém me veja, me traga um litro de café, ou dois.


A tentar confundir o chefe, armada em raiz de Embondeiro, porque acabo de o ver passar com oitenta e nove folhas escritas à mão, para passar a computador. Em inglês.

Cinco para as onze.
Uma estúpida tentativa, eu sei,  para ver se me deixam sair mais cedo para o almoço.
Ontem não deixaram. Eram quatro da tarde e ainda não tinha almoçado.

A tentar passar-me por agenda de contactos rotativa. 
Assim como assim, desde que existe o Outlook mais ninguém ligou aquela porra.
A não ser para procurar o contato do senhor que costuma cortar as silvas na casa do Alentejo. 

A levitar. Talvez se assustem e pensem que sou um fantasma qualquer.
A minha colega que vinha com cinquenta mil dossiers debaixo do braço para eu ver, olhou para baixo da secretária e não me viu: olha já saiu!
'Fixe Uva, já enganámos mais uma.'


A fazer de mesa de jogo com pés de galo. Está mais que visto que na hora do trabalho ninguém joga sem ser on-line.
Vai daí que duvido que me encontrem nestes preparos.


Travesti-me de Volkswagen. Por esta não esperavam eles.
A frota aqui da casa é Mercedes. Vão achar que se enganaram no escritório e voltam outra vez para os seus buraquinhos. Espero que bem profundos.


Vão achar que um serial killer me entrou pelo gabinete  adentro e me arrancou a cabeça, colocando-a  ao pé do rabo, e coiso e tal, como é que isto??
Fogem de susto, e talvez eu posso descansar, pelo menos até chegarem os polícias.

A fingir que sou a esfregona das escadas de serviço. Ninguém quer saber de uma esfregona de carapinha, quando toda a gente do escritório (menos eu) tem uma  bimby.

 RESUMO DESTE POST
Não sei se perceberam, pois que é uma mensagem bastante subliminar, e os corpos nus, enfim, toldam-vos o discernimento, mas o que aqui está escrito nestas caixinhas, com estas amigas a fazerem-se passar por letras é: 
SALVEM-ME DESTA TERÇA-FEIRA QUE EU QUERO É DORMIR! 
Obrigada.

20 de outubro de 2014

A culpa nunca morre solteira

Atentem bem nestas palavras, musica para os meus ouvidos, que escutei ainda há pouco:
'ná, isso da matemática depende muito dos professores.'
Ahhhhh, benzádeus, pensei eu encantada, afinal não fui a única culpada disto tudo, de me afogar em tantas letras, que eu era ainda uma criança quando o meu avô paterno me juntou a custo com os primos do Colégio Moderno, sei lááááááá, e largou esta pérola da matemática aos netos: o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos catetos.
Mas que criança  poderia compreender tal coisa?
Que interesse poderiam ter aqueles pequenos burgueses, todos de cabelo muito lambido e hiperlordose, nas palavras do avô, senão a certeza de que um dia lhe haviam de ficar com a casa de Lagos?
Uva! Gritava ele. O que são catetos? E eu, de costas muito direitas, retorquia muito aflita: que tetos avô, que tetos?
E ele lá continuava, monocórdico e enfadado, falando somente para os soberbos netos, enquanto eu fazia contas de cabeça sobre a melhor forma de colar a pastilha por baixo da cadeira.
Hoje, quando ouvi a frase ali de cima, voaram-me os pensamentos. 
É certo que o meu avô não me enfiou nada na cabeça, além de uns carolos bem valentes nas aulas dos catetos, mas a culpa não foi (só) dele.
Vejamos então como tudo (me) aconteceu.

"O Bacalhau" - Matemática (7º):
Homem rural, de grande cabeça pastosa, conhecido agricultor de Caneças, que também lecionava em números.
Logo que chegava à sala, sacava da sua antena de rádio, esticava-a como quem mata um coelho, e apontava um qualquer exercício no quadro negro.
Uva, ao quadro! E eu, que tinha um medo imenso daquelas unhas enormes e grossas, cheias de merda até ao sabugo, não conseguia perceber como é que um agricultor de Caneças, que não lavava o cabelo, as calças, a camisa e as restantes miudezas,  há mais de duas décadas, poderia querer ensinar a alguém uma ciência 'pura como água cristalina'.

"Dez para as duas" - Matemática (8º ano)
Uma mulherzinha muito atarracada, de olhos cínicos e perna curta, que debitava exercícios como um relógio; mas não foi isso que lhe deu o nome.
Tinha um problema nos membros inferiores. A posição dos pés, se sobrepostos num relógio, davam a hora certa. Dez para as duas. Tic, tac, tic, tac, patinhava ela pela sala, com os seus pés de pato enfiados numas socas brancas ortopédicas.
Reza a lenda que um dia, uma aluna que chegava sempre atrasada, substituiu o giz por um tampão. À pergunta da pobre professora: de quem é isto? toda a turma devidamente instruída, se levantou, à vez, respondendo como no anúncio: é meu, é meu, é meu!
Todos ficaram a conhecer a ira da pequena senhora, e a pobre rapariga viu-se grega para fazer o exercício que ainda por cima estava errado, esfregando com um OB num quadro acabado de lavar.

"Cuecas" - Matemática (9º ano)
Chegou decidida a fazer boa figura numa substituição inusitada, mas era uma moça muito estranha.
Alta, morena, entrava na escola de cigarro na mão e malinha à tira-colo, abanando muito a cabeça. Assim que se assomava no pátio principal, atraia para si tanto rapazola, que haveriam de pensar, quem visse a cena de longe, que era um enxame de formigas de volta dos restos de um Bolicao.
Não usava cuecas, e durante a leitura do problema que dava o mote à aula, sentava-se no corredor do meio, sempre de perna aberta, chamando todos os alunos a sentarem-se nas mesas da 'coxia', para que a ouvissem melhor. Passou toda a gente, mas ninguém aprendeu nada.
De jeito.

"Vira-Bicos" - Matemática (10º ano)
Era o temível diretor da escola. Era um grande estrábico e ora olhava com o olho virado para bardamerda, ora com o olho virado para infinito.
Ninguém sabia ao certo com quem falava, razão pela qual todos se levantavam ao mesmo tempo quando ele usava da sua frase preferida: Tu aí! Rua!
Um dia, perdido de raiva, disse: essa mesa aí do fundo, rua!
As duas alunas dessa mesa, uma delas conheço-a bem, levantaram-se ordeiramente, e acatando a ordem superior, levaram a mesa para a rua.

"Pingas" - Matemática (11º):
Vivia a quilómetros de distância e percorria todos os dias o caminho para a escola, pela via rápida, juntamente com o trânsito infernal, mas a pé.
Chegava todos os dias muito bem acompanhado, com a carraspana do costume e um pauzinho de madeira que usava para tirar a cera dos ouvidos.
Lecionava os números como quem ensina filosofia, e logo pela manhã, quando começava divertido a escrever no quadro preto, acabava sempre a frase na parede, furioso por ninguém o avisar que o giz é branco e ficava difícil ver o resultado.

'ná, isso da matemática depende muito dos professores.'
Ahhhhh, a culpa nunca morre solteira, e eu que fui a única neta que não andei no Colégio Moderno, sei lááááá porquê, sou a única que tem estas histórias para contar.
Tudo o resto são catetos.

18 de outubro de 2014

Obrigada a todos pela vossa visita

Isto é parolo.
Alguns poderão dizer que é um grande golpe de marketing, orquestrado pelo agente da Jessica Atayde, que aqui veio fazer uma perninha.
Muitos vão dizer que eu sou uma lambisgóia armada aos cucos, com a mania que sou uma Uva.
Outros dirão que não é possível, nem nos sonhos mais selvagens, que um blog que é uma autêntica salganhada de temáticas, mal escrito e mal conduzido, que nasceu não fez ainda um ano, possa ter chegado a este dia, contra todas as expetativas da sua autora, que sou eu, uma loira careca sem eira e nem beira, com o contador a apitar nas 50 000 (cinquenta mil!!!) visitas, quando estava escrito nas estrelas, que ao fim de um mês, e depois de três ou quatro patacoadas sobre um certo Rule of Law, havia de se desfazer, como se desfazem os rabos dos cometas.
Em cinzas.
É um número ridículo, que se esfuma perante contadores que de três em três segundos têm alguém a bater-lhes à porta, quando Pipocos, Palmieres sem cobertura de chocolate, cenas de Sexo, Mirones escondidos, Marias vai com as outras e tantos outros blogs de grande qualidade, que varrem diariamente assuntos e Migalhas de suma importância para todos nós, alguns muito Picantes, outros a saber a Ervilhas, que aceleram na bloga como Binas sem travões, alguns aos trambolhões, salpicados de Notas de rodapé, tão Cor de rosa como as cuecas, ou as Lindas cuecas do fim do mundo, amarelas como o Bagaço.
Eu, a uva Redonda, saloia e parola, que lava o cabelo com OMO, que planta a dúvida infernal no que à sua profissão diz respeito, mas que tem muito respeito por certos Pássaros pretos que poisam aqui e ali, alguns Xilreando, outros dançando, e muitos anónimos imperfeitos que a chamam de Uva mijona, chega aqui a este simbólico número, muito contente. E porque não Quiescente?
Passam por aqui diariamente pessoas conhecidas, desconhecidas, amigas, inimigas, saudosas, sozinhas, valentes, contentes, galinhas, estridentes, maravilhosos seres descontentes, nesta cesta que é a vida.
Para esta Uva, os dias que passo aqui não são todos Cães, e Calma lá com o andor se pensam que isto faz grande furor, lá na rede do americano.
O meu blog é a minha alegria, é aqui que a minha voz se Solta, que leio, que verto Tim tim por tim tim o que acho que devo, e que depois escrevo, que treino, que aperfeiçoo a arte da escrita, do pensamento, da critica, o meu conhecimento.
Não tenho na minha variz literária, aquela que me rebentou o ano passado, num dia tão cinzento como o de hoje, Preguiça, ou um querer mais além do que ganhar algum dinheiro, com o rim que me resta.
E isto é assim: se Duvidas houver, estou aqui para me divertir, crescer, contar, extravasar e colocar-me do avesso.
Porque 50 000 é pouco.
Mas eu sei que mereço.

Obrigada a todos.
Aos vizinhos, aos amigos da caixinha, aos leitores e aos comentadores.
Esta Uva agradece a vossa inestimável paciência.

Bem vindos ao meu delírio.
Dinada.

PS: Simão, escuta: isto ainda agora começou.
Chegaremos ao céu no preciso dia em que o nosso blog constar na primeira página de um jornal.


Pode não parecer, mas estão aqui 50 000 mil caracóis!

17 de outubro de 2014

Da congelação de óvulos - o embuste do novo patronato

Há decerto quem não saiba, talvez por ser tema de pouco interesse ou pouco conhecido da generalidade da população (preocupada naturalmente com outros afazeres e prioridades), que as mulheres, ao contrário dos homens que fabricam espermatozóides por dá cá aquela palha, nascem com os óvulos todos à nascença. 400.000 meninos imaturos, muito tontinhos, que só serão alguém, por alturas da puberdade, e só farão parte da diabólica estatística humana, se algum espermatozóide, igualmente tontinho, o fertilizar decentemente. 

Estes óvulos, que se 'gastam' ou melhor, que desaparecem a cada menstruação, não voltam a ser substituídos pela perfeita mãe-natureza, muito embora sejam em número bem maior do que o número de óvulos que são 'utilizados' durante toda a vida.
Dá-se porém o caso, tal como no universo em geral, e nas mulheres em particular, que também os óvulos envelhecem com o tempo. 
Este fenómeno, contra o qual todos lutamos diariamente, uns mais acerrimamente do que outros, mas todos com igual interesse, chamado de envelhecimento ou declínio, como queiram, acontece sobretudo a partir dos 35 anos, altura em que a produção da hormona do crescimento decresce substancialmente para níveis ridículos, e todos nós deixamos de nos 'renovar' celularmente de forma tão profícua, como é apanágio na juventude, em que qualquer ferida, entorse ou maleita, se cura rapidamente sem deixar rasto. Se aos quarenta já nada resta desta hormona, aos quarenta e cinco, é a lei da gravidade a grande vencedora, e andamos três semanas com a mesma nódoa negra.

Ora nestes termos, será fácil deduzir que se atualmente, por coisas cá da nossa vida laboral ou pessoal, a grande parte dos casais optam por ter filhos após esta idade, e que se este período coincide (também) com o declínio da fertilidade na mulher, a procriação ficará muito mais comprometida, e ter filhos poderá tornar-se num inferno ainda maior do que não os ter.

Acontece que somos muito inteligentes e tudo inventámos para inverter esta triste realidade e eu, que não sei o que me reserva o futuro, fico muito 'descansada', e este é o termo certo, assim mesmo entre comas, por haver uns senhores doutores que conseguem congelar-me os óvulos para que eu possa mais tarde, talvez depois da empresa do meu patrão se internacionalizar para Marte, Jupiter e Saturno, eu possa enfim ter os filhos que não consegui ter no intervalo das reuniões de direcção, das viagens intergaláticas à procura de outras formas de vida, ou porque estava muito ocupada a enriquecer o meu patrão com a minha 'eterna' juventude em idade fértil.
Pois na realidade, é aqui precisamente que quero intervir.
Alguns patrões, muito preocupados com o bem estar das meninas lá do escritório, resolveram por estes dias, pagar-lhes a congelação dos óvulos para que elas possam aproveitar ao máximo a excitante vida  laboral e libertá-los, (a eles e a todos os membros do C.A.), da velha e cansativa culpa de terem de as despedir antes que atinjam o auge da carreira, substituindo-as por uma tonta qualquer, de preferência infértil.

Atentemos neste impiedoso mas real exemplo: 
V/Exa. Patrão da barca, pagou-lhes romanticamente esta 9ª maravilha do mundo que é congelar óvulos, e prometeu-lhes o Universo. Não procriarás (por enquanto) e dedicar-me-ás toda a tua pujança, antes que a mesma te seja sugada por um faminto bebé. Eu logo te farei o devido bullying quando achares que está na hora da descongelação, e eu achar que não, que os óvulos são meus, que afinal fui eu que tos paguei.
Patrão da barca faliu, ou desintegrou-se no caminho lunático para Marte, e as coitadas ficaram na merda, sem emprego, com 45 anos de idade e com 5 óvulos na gaveta de cima do congelador, juntamente com as couvetes do gelo.   

Antes de avançar, gostaria de perguntar a este patrões, que pagam amavelmente a congelação dos óvulos às suas trabalhadoras em idade fértil, a quem pensam eles vender os seus produtos no futuro, se as mulheres não tiverem filhos.... ou então entrar por caminhos apertados, nomeadamente aqueles da crescente dificuldade (ou impossibilidade) de se levar uma fertilização in vitro a (bom) termo, com 35, 40 ou 45 anos de idade, mesmo que os óvulos tenham 20 anos, mas talvez não seja necessário explicar novamente a história do declínio e da gravidade.

As agora modernas mães de 45 anos, induzidas por esta mesquinhez patronal, travestida de providência e de solidariedade, que tiveram filhos através de técnicas avançadíssimas de congelação de óvulos pagos pelo Patrão da barca, esse grande mecenas da procriação assistida, vão sentir-se muito realizadas e felizes aos 70 anos, com os seus filhos de 20? Não, não vão.
Porque com 70 anos, além da angustia de não os poderem acompanhar muito mais tempo, já cheias de problemas de saúde e de dinheiro, sim porque neste entretanto o Patrão da Barca ficou multimilionário mas elas não (que viver custa umas massas valentes), estarão a sobrecarregar os seus filhos de 35 anos, altamente dependentes, imaturos e sem dinheiro, que estarão também eles a trabalhar sofregamente, e a congelar óvulos (como a mãe fez aos 30), e que não vão ter tempo e nem dinheiro para lhes pagarem um lar condigno, ou (que seja) lhes tratarem da velhice e dos problemas da falta da hormona do crescimento.

Eu, que sou uma mãe estupidamente tardia (perdida que andei nesse nem-nem - e que repeza estou), considero muito perigoso esta possibilidade de avançar com a decisão de ter filhos até ao inconsciente da idade, em prol da carreira, de um egoísmo tremendo, porque as mulheres que preterem os filhos à carreira, ou que se deixam levar por estes embustes do patronato, este 'descanso' artificial medicamente assistido, deviam acordar mais cedo para a temática da infertilidade associada ao envelhecimento das estruturas físicas que permitem (ou inviabilizam) a gravidez, percebendo que um corpo de 40, 45 anos constitui um grande obstáculo à procriação, e que aos 70 anos, as mães devem é andar com os netos às cavalitas, ao invés de andarem os filhos, com elas às costas.

Se uma mulher quiser ter filhos e puder ter filhos, deve ficar muito atenta a este novo 'descanso' de ter um punhado de óvulos congelados, porque conseguir ser mãe não depende só dos óvulos, e ademais, entregar assim a sua juventude a um bando de engravatados (que têm lá em casa a mulher a parir de ano a ano - claro!)  é injusto para elas, já que tudo tem um tempo, e será muito complicado para os seus filhos, no futuro.

Isto das mães idosas, vai ser um grande sarilho.
Ai vai vai.

O que é que se passa com os nossos carecas????

Sinceramente minha gente, e olhem que eu até compreendo a dor que deve ser a perda do cabelo. 
Rapazes tão novos e já carecas, é daquelas coisas que me fazem uma certa pena e com a qual realmente me compadeço.
Aquilo tira-lhe anos de vida, fá-los gastar fortunas em produtos, capacetes a laser, e eu sei lá mais o quê, execeção feita a alguns casos que se valem da bonita cabeça ou da bela cara, ou de um lábios carnudos e olhos sedutores, mas ainda assim, tristes com a realidade que lhe tocou em sorte.
Ninguém deveria ficar careca.
Mas daí até ao estado a que chegámos, é que sinceramente minha gente, vejam lá isso.
Tenho andado pouco na rua ultimamente, por coisas cá da minha depressão de outono, e distraída como sou, sempre com a cabeça nesses ares, não me tinha ainda apercebido que quase todos os nossos jovens carecas adotaram por estes dias o look Raúl Meireles.
Ò valha-me Deus!
Por acaso até pensei, quando vi os primeiros espécimes, que aquilo era uma daquelas coisas passageiras, feitas por rapazes muito fashion, os mesmos que usam as calcinhas skiny muito decaídas, com uma viradinha na bainha, e que não passava disso.
Qual quê! De cada vez que entrava numa loja de roupa, numa pastelaria ou caminhava pela Avenida, fui reparando que TODOS os jovens carecas da minha cidade deixaram crescer uma barba à judeu ortodoxo, como que querendo dizer: olha lá miúda, tu não te iludas, que eu sou granda careca mas ainda tenho uma barba (muito) rija!

É caso para (eu) dizer que a moda à Raúl Meireles não lembra ao careca!
Ou mais: quem é que no seu perfeito juízo se quer parecer com o Raúl Meireles???

Hum? Supé giro...

16 de outubro de 2014

És o ser vivo, mais vivo que já conheci.

Olá pequena!
Um abraço, pois vá lá, que eu sei como tu gostas.
Mas sabes, encurvas-me as costas,
por seres tão pequenina,
e eu sinto-me desajeitada nos teus braços, mas tu sabes tudo dos meus precalços,
tu sabes que sou fria.
Pois claro, a seguir é o beijo, dá-me lá um beijo, se é isso que queres,
mas só um, que eu bem sei que tu és como as mulheres que se cansam por dar dois beijos,
especialmente aos cabeçudos que não vivem no jardim,
andam antes por aí, a bater com as cabeças.
Anda lá se é isso que queres, mas agora não me aborreças,
sabes que não gosto dessas tretas, de tias esticadas e enfermiças, sempre agarradas às missas.
Mostra lá. Faz lá a tua voltinha, pousa aí no canto os sacos,
e mostra-me lá os sapatos, e as travessas que já não usas.
É melhor fechares a porta, talvez sair do corredor,
anda lá, vem cá comigo, hoje não está o sôutor.
E essa saia tão curta, onde a foste encontrar?
Ah, já percebi, foste comprá-la de atacado, aos chineses do mercado.
Mas não te fazem alergia?
Queres lá saber de comichões, se estás nessa alegria.
Que relógio trazes tu? Bem bonito sim senhora, e vai bem com as Melissas,
e as cobiças, que não te largam.
Larga as velhas da igreja, senta-te aqui ao pé de mim, conta-me tudo, que tu sabes,
aqui não moram invejas.
E que disse o Presidente? Achas que é boa gente? E sempre gostou da obra?
Tem cuidado minha pequena, voltinhas só aqui, ou escondida no jardim,
não lhe ponhas a cabeça à roda,
que os teus beijos são rosas, para plantares noutro jardim.
És tão viva e tão pequena, pareces uma princesa morena, que veio dar à minha costa.
Falas tanto e tão depressa, mas não te percas na novena, que este mundo já não gosta.
És uma artista desta vida, não te quero aí perdida, não te quero ver tão torta.
Respira fundo e pensa assim:
sou uma rosa do jardim, e agora que estou viva,
viva estarei enfim.
Sou o ser vivo, mais vivo que já conheci. 

Para X.
Com amizade.

Um comprimido de merda por dia, nem sabes o bem que te fazia.

Afinal comer merda já não é assim tão mau quanto se pensava, e à frase mais ouvida nos últimos tempos: 'tu só comes é merda', a resposta não se fará esperar: 'com muito prazer!'

Para ler (quando não estiverem a comer).

Blhec!

15 de outubro de 2014

Uma mão cheia de nada, e outra de coisa nenhuma.

Lembrei-me outra vez daquele dia.
Sentaste-me numa cadeira e abriste-me um tomate. 
Os teus dedos sapudos, de unhas muito curtas, faziam malabarismos com a faca ao mesmo tempo que seguravam um cigarro. 
Fumavas muito nessa altura. O pacote azul desfraldado, sempre amarrotado dentro dos jeans, fazia-te mais companhia do que eu. 
Que querias? Era uma selvagem. Criei-me na rua, com o machorros.
- Que vida é a tua?
Perguntaste-me num fio de voz enquanto procuravas o sal perto do fogão.
- Queres que ponha, ou preferes fino? 
Fiquei ali sentada, muito quieta, a olhar para ti.
- Não gosto de sal fino, sabe-me a micróbios.
Largaste uma gargalhada e pousaste o cigarro na bancada com a ponta virada para o tapete.
Aquele cigarro havia de ali ficar muito tempo, suspenso, fazendo um caminho de cinzas, igual ao nosso, tão frágil e tão cinzento.
Enquanto mastigava o tomate salgado, franzindo muito o cenho, como se procurasse a expressão certa para te responder, sentaste-te à minha frente e desapertaste o primeiro botão das calças.
- Então, e daqui para a frente? Posso contar contigo, ou queres ficar como eu?
Fizeste-me tremer os lábios. Tive pena de ti.
Naquele dia, se mo tivesses pedido, seria capaz de vencer sozinha a batalha contra os mouros, prometer-te-ia Castela, dobrava o Bojador.
E eu, tão igual a ti, como sempre fui, não achava mal em ser como tu.
- Qual é o mal? Estou farta da escola.
Dançavas tão bem e eras tão alegre. Qualquer coisa se arranjaria. E se tivesse mais dinheiro podíamos comprar mais roupa, afinal só precisavas de por umas palmilhas e os allstar serviam bem para duas.
- Eu a falar do teu futuro e tu só pensas em roupa. Queres outro? Já estou atrasada.
A conversa desconversava e o caminho não ia lá por onde querias. Via-te preocupada, pressionada, compreendia que na tua cabeça a salvação era a escola, o curso. Derramavas sobre mim um sonho que era teu.
Afinal somos iguais, tão iguais que me confundiste contigo.
- Escuta lá, a mãe faz um esforço. Já pensaste bem nisso? Anda lá.
Quando abri os olhos, já era outro dia e tinhas uma fita verde na mão.
- Que queres que escreva? Não tenho jeito nenhum para isto. Ahh que cor tão linda. É de seda?
Não mãe, é de cinza. 
Mas tu não sabias e eu disse-te para escreveres assim:

No dia em que de ti nada esperava, e numa mão coisa nenhuma, e a outra cheia de nada, percorremos juntas o caminho das cinzas, desbravando as longas estradas, e agora que chegaste ao destino, o que tens?
Nada.
Fizeste-me tremer os lábios.
Tenho pena de mim.



Até onde eras capaz de ir, para ter o corpo perfeito?

Lambia três limões e mastigava oito azedas.
Lavava os dentes com CIF, e esfregava pimenta nos olhos.
Raspava as unhas na terra, e tirava com elas a comida dos dentes.
Engraxava o cabelo de preto e enrolava a esfregona molhada ao pescoço.
Comia os macacos do nariz e cortava as unhas dos pés com os dentes.
Tirava a cera dos ouvidos para sarar a frieira do lábio.
Dava uma dentada num sapo e usava a pele para tapar as olheiras.
Roía pedra pomes com os dentes da frente fazia a depilação com cera de alforreca.

- E tu Uva? Até onde eras capaz de ir, para ter o corpo perfeito?
- Eu? Eu era miúda para me deixar ficar por aqui, a roer os cotovelos.


Se a inveja matasse...
.... a Jihad Islâmica já aqui tinha uma sucursal de recrutamento.

14 de outubro de 2014

Black & White










See ya!

Uma Uva muito pouco católica

A minha primeira experiência com a Igreja, tinha eu seis anos, foi numa velha sacristia, pela mão da minha mãe, coitadinha, que já não sabia o que me fazer, com um padre careca a abanar a cabeça e a dizer que não, que não podia ser, que a menina não era baptizada, e por isso não poderia fazer parte dos escuteiros, e assim tornar-se numa criatura de Deus.
A minha segunda experiência com a Igreja, tinha eu sete anos, já a minha mãe se tinha recomposto da nega do padre careca, foi quando a catequista a abordou, coitadinha, para lhe dizer que não havia qualquer hipótese da sua filha continuar nas aulinhas da catequese, e eu já lá tinha ido três vezes, o que me chateou porque já estava muito habituada aquilo, porque a sua filhinha insistia em pintar a cruz do menino Jesus de vermelho e outros desenhos celestes, de cores muito escuras, às vezes com riscos.
Um sacrilégio, um horror, um pecado. E dos grandes.
A minha terceira experiência com a Igreja, sim porque não há duas sem três, foi num domingo radioso de sol, quando eu e uma primita minha, também em pecado, resolvemos entrar na igreja escura e bafienta do padre careca, para assistir, às escondidas, à missa dominical. 
Assim que sentámos o rabo nas cadeiras de pau, com as perninhas muito juntas e as costas muito direitas, eu a olhar para o teto e a minha primita a olhar sabe-se lá para onde, o padre, esse moiro de Deus, deu connosco no meio de toda aquela turbe de mulheres muito santas, e disse: 'as meninas aí do fundo podem sair. Não podem assistir à missa as pessoas que não são batizadas'.
Os dois bodes expiatórios, eu e a minha primita, corremos dali para fora, a rir,  e eu ainda trouxe agarrado às manitas um livro com páginas cheias de sebo, que versava músicas que nunca pude cantar.
E o padre careca, aquele que também não quis casar a minha mãe, por motivos lá da sua religião, também não fez a vontade à minha avó, que coitadinha, jurava a pés juntos que eu tinha o diabo no corpo e só batizada conseguiria tirar-me o azougue.
Mas eu não desisti, e se não há duas sem três, não há três sem quatro.
Vesti-me então de amarelo periquito, e com oito anos já largados, fui finalmente batizada, juntamente com todas as primas da família em pecado, numa igreja nos confins do Alentejo, em obras e sem altar, por um padre alemão muito alto que não falava alentejano, muito menos português, que usava umas meias muito brancas dentro de umas sandálias muito feias, que nos molhou a cabeça da melhor maneira que conseguiu, retirando com o côncavo da mão uma águinha muito pura que repousava numa bacia de plástico, azul.


O padre careca chamava-se Manel.
E quanto mais longe vão os (meus) tempos em que os padres carecas eram os ignorantes Donos Disto Tudo, mais perto me parece o tempo em que um único padre, que é tudo menos ignorante, vai conseguir fazer aquilo que nenhum outro conseguiu fazer, (sem ser pelo medo e pela ignorãncia dos fiéis), que é transformar pelo menos uma das religiões, em alguma coisa de bom.
E chamar para si as criancinhas.
Esse padre chama-se Francisco.

13 de outubro de 2014

'Os Maias' de João Botelho - by Uva Passa

Olá, olá.
Pois que ainda não tinha vindo aqui falar-vos desse mistério, ou direi buzz, que está instalado em redor do filme do João Botelho e que, esgotadíssimo, tem levantado imensa fervura nas tertúlias cinematográficas por esses botecos a fora.
Em primeiro lugar, e antes que me esqueça, como se isso fosse possível, em frente ao Cinema Ideal, onde vi o filme, instalou-se a 8º maravilha do mundo em pasteís de nata.
É verdade. Um cunico do tamanho de um Bago de Uva, sem mesas, sem bancos e sem peneiras, a Manteigaria União, deu em fazer, para mal de muitos dos meus pecados (quase todos) uns pastéis de nata de morrer e chorar por mais, se isso acaso fosse possível, e na verdade é, se pensarmos que uma pessoa prova aquilo, e depois quer morrer e não pode.
Pois não morram sem lá ir, que são deliciosos.

 Manteigaria União (ao Largo de Camões)

O filme. 
Pois o filme é do João Botelho, eeeeee levei três horitas naquilo.
Vê-se muito bem, por acasos, mas a primeira parte é um nadinha macambuzia, com planos inclinados e tremeliques de câmara a fazer parecer um filme de terror dos anos dez, mas enfim, são apenas vinte minutos no total das três horas, e vale muito a pena acordar, quando essa parte acaba.
A primeira crítica é para o protagonista. Um rapaz tão engraçado, tão jeitoso, e coiso e tal, metido com uma brasileira... Ó Botelho, não se faz. Ainda para mais depois de saberes, e não sabes tu outra coisa, o que as brasileiras andam a fazer aos casamentos cá do burgo.
Teria preferido um Carlos da Maia mais sedutor, mais atrevido, ao invès dum médico barbudo e sem brilho, que passa a maior parte do filme sentado, com um Poodle no colinho.

Por mim substituía o Carlos da Maia [Graciano Dias] pelo Vilaça [Filipe Vargas - na foto] e o filme era logo outro. Mas isso sou eu a dizer.
Na Casa do Ramalhete, que mais parecia o jazigo do Conde Drácula (tal foi a tenebrosa decoração que lá se fez), esqueceram-se  das janelas, coisa que me encanitou, mas não se iludam se pensam que foi só o Ramalhete que caiu na desgraça do cenógrafo, que não foi, tudo é tenebroso naqueles cenários, mas talvez o ICA não tivesse dinheiro para mais.
Quem sabe?

O Ega [Pedro Inês] esse personagem maior, começou tímido, inseguro e pouco trabalhado, mas depois foi o melhor do filme. Chique a valer.
Um grande aplauso para Tomás Alencar [Pedro Lacerda] que foi o meu preferido, e outro para a minha diva Rita Blanco, que na sua minúscula participação, ficou na retina de toda a gente.

Carlos da Maia [Graciano Dias] e Tomás Alencar [Pedro Lacerda]

Mas fez-me rir.
E não é um filme cómico.
Fui ver ao cinema, mas não é um filme.
Não fosse o Eça, e o filme era bem capaz de ser um flop.